A proporção da população cabo-verdiana a viver em pobreza extrema cresceu em 2020 para 13,1%, o valor mais alto desde 2017, segundo o anuário estatístico, divulgado hoje pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).

“Estima-se que em 2020, 13,1 % da população em Cabo Verde vivia abaixo da linha da pobreza internacional [com menos de 1,90 dólares por dia]. Dessa população, 8,2% encontrava-se no meio urbano e 24,3% no meio rural”, refere o relatório anual do INE, que compila várias estatísticas, consultado pela Lusa.

Em 2019, antes dos efeitos da crise económica provocada pela pandemia de covid-19, essa proporção, segundo o INE, era de 12,7% e no ano anterior de 11,1%. Em 2017, a pobreza extrema afetava 13,7% da população cabo-verdiana e no ano anterior 18%.

Segundo o INE, em 2020 mais de metade da população (51%), equivalente a cerca de 286 mil pessoas, estavam cobertas por pelo menos uma prestação de proteção social, entre apoio a crianças, à maternidade, subsídio de desemprego ou de invalidez, e pensões de reforma.

Em 2016, as prestações sociais chegavam a 43,6% da população (231.728 pessoas), número que tem crescido todos os anos, segundo o indicador do INE.

“Cabo Verde tem vindo ao longo dos anos, a pautar-se por políticas de proteção social cada vez mais abrangentes contribuindo, para a redução das desigualdades, redução da pobreza extrema e um desenvolvimento sustentável, traduzindo num aumento da população coberta por pelo menos uma prestação de proteção social, nos últimos anos”, sublinha o INE, no mesmo documento.

“O nível da cobertura efetiva da população em Cabo Verde, está acima da média mundial, situando em 46,9% em 2020. A nível do continente africano, a cobertura efetiva foi estimada em 17,4%, sendo 13,7% na África subsaariana”, acrescenta.

O arquipélago enfrenta uma profunda crise económica e financeira, decorrente da forte quebra na procura turística — setor que garante 25% do Produto Interno Bruto (PIB) do arquipélago — desde março de 2020, devido à pandemia de covid-19.

Em 2020, registou uma recessão económica histórica, equivalente a 14,8% do PIB, seguindo-se um crescimento de 7% em 2021 impulsionado pela retoma da procura turística. Para 2022, devido às consequências económicas da guerra na Ucrânia, nomeadamente a escalada de preços, o Governo cabo-verdiano baixou a previsão de crescimento de 6% para 4%.

O primeiro-ministro cabo-verdiano exortou em maio o país a assumir a meta de “eliminar” totalmente a pobreza extrema e garantiu que Cabo Verde vai pagar “com resultados” o financiamento do Banco Mundial ao Projeto de Capital Humano.

“O valor do programa é significativo e à semelhança do que tem sido a trajetória da gestão dos programas com o Banco Mundial, nós estaremos cientes de que teremos uma boa execução”, afirmou Ulisses Correia e Silva, na Praia, na apresentação do Projeto de Capital Humano financiado pelo Banco Mundial (BM) em 26 milhões de dólares, para apoiar milhares de famílias no acesso a serviços básicos e educação.

“As carteiras do Banco Mundial em Cabo Verde, enquanto parceiro do desenvolvimento, têm tido um bom desempenho e nós iremos devolver o financiamento através de resultados, que tocam as pessoas, que possam melhorar a qualidade de vida das pessoas e que criem futuro, particularmente para os jovens e para as mulheres”, disse o chefe do Governo, na apresentação do projeto, financiado através da Associação Internacional de Desenvolvimento, organismo do grupo BM que fornece empréstimos sem juros e subsídios aos países mais carenciados.

Em concreto, o Projeto de Capital Humano em Cabo Verde, a implementar até 2027, estima apoiar mais de 3.500 pessoas em agregados familiares pobres e vulneráveis, facilitando-lhes o acesso a serviços básicos e condições de vida, mais de 40.000 pessoas em agregados familiares “pobres e vulneráveis, tornando-as mais social e produtivamente incluídos”, através de programas para melhorar o acesso a cuidados infantis, a formação empresarial e ao empreendedorismo.

Vai ainda apoiar quase 40.000 jovens em idade escolar “que deverão beneficiar de um currículo de ensino secundário mais orientado para o mercado de trabalho”, e 4.550 jovens e mulheres “a obterem certificados de cursos de formação profissional relevantes para o mercado de trabalho”.

Ulisses Correia e Silva sublinhou que o projeto tem o sistema educativo como central, enquanto “suporte, alicerce e impulsionador de transformações”, tendo em conta a necessidade de “quebrar o ciclo vicioso da pobreza que se transmite de pais para filhos”, facultando à população mais carenciada, também, acesso à saúde, rendimento, trabalho e habitação condigna.

“Para podermos de facto eliminar a pobreza extrema, não digo reduzir. Nós temos de ter a ambição mesmo de eliminar em Cabo Verde a pobreza extrema, porque mexe com a dignidade das pessoas. E reduzir a pobreza absoluta, na medida em que também é importante para o crescimento económico”, apontou Ulisses Correia e Silva.

O Governo cabo-verdiano admitiu no final de 2021 que o país tem 115 mil pessoas na pobreza extrema — que vive com menos de 1,90 dólares por dia, para uma população total de quase meio milhão – e assumiu o objetivo de a erradicar em cinco anos, tendo lançado para o efeito o programa MAIS – Mobilização pela Aceleração da Inclusão Social, envolvendo organizações não-governamentais e outras entidades da sociedade civil.

Por: Lusa